Desde há semanas, a escola pública e os professores são notícia de “primeira página” e de abertura de telejornais. Aos problemas estruturais que, incompreensivelmente, subsistem há décadas, juntam-se as dificuldades decorrentes da gradual municipalização da educação, a par da preocupante falta de vocações para o ensino.
Para bem de todos, espero que, nos próximos dias se mitiguem posições e se vislumbrem acordos. A escola precisa de professores (e funcionários) tranquilos e motivados, para depois entusiasmarem as crianças, os adolescentes e os jovens – “o futuro da sociedade”.
Sem se dar conta, porque faz pouco ruído, o ensino não estatal caminha ao seu ritmo, procurando cumprir a sua missão. Mas também esta escola necessita de ser apoiada. E poupando tanto ao erário público, merecia dos governos maior atenção e respeito, ao invés do que atualmente sucede, praticamente ignorando-a e remetendo-a apenas para as famílias com algum suporte financeiro. Também aqui existem problemas e preocupações, decorrentes da progressiva (e generalizada) falta de professores, da instabilidade económica das famílias (a maioria das quais sem qualquer possibilidade de pôr os filhos numa escola privada da sua preferência) e do insignificante apoio financeiro estatal às famílias carenciadas, impedindo-as, na prática, de usufruir da liberdade de escolha, consagrada na Constituição.
A outro nível, para esta tensão – e agora incluo todas as escolas, públicas e privadas – também contribuem os principais destinatários da escola – os alunos. Cada vez mais os professores (e outros agentes educativos) se queixam da sua irreverência, desde muito novos. Habituados que estão a “mandar em casa” e a facilitismos de diversa ordem, quando vão para a escola, normalmente no pré-escolar, acham que podem fazer o que querem, desde falar quando lhes apetece, a bater em colegas e desobedecer aos educadores. Quando mais crescidos, querem continuar a “mandar” e até escusam de estar com atenção nas aulas, pois no final das atividades letivas os explicadores (ou os pais) estudam por eles.
Felizmente, este não é o retrato da maioria dos alunos. Mas numa turma de 20 ou 25, bastam dois ou três com este perfil para contagiar outros e afetar significativamente o plano de uma aula. É óbvio que tudo isto desgasta – e de que maneira! – os professores. Se depois juntarmos os processos burocráticos, sempre morosos e fatigantes, adstritos a alunos com perturbações no seu comportamento ou com mau aproveitamento, o resultado é esta “alta tensão” que paira nas escolas e se repercute na sociedade.
E para a tensão ser ainda mais alta, uma percentagem significativa de pais/encarregados de educação, mesmo de bons alunos, projeta muita da sua “tensão interna” nos diretores e nos docentes. E culpa a escola de tudo, inclusivamente do mau comportamento e do mau aproveitamento dos filhos, pois – segundo eles – são os professores que não sabem utilizar estratégias adequadas e diferenciadoras. Num cenário em que o professor é, infelizmente, visto como o elo mais fraco, facilmente meia dúzia de pais numa turma galvaniza (e, às vezes, manipula) os outros pais, criando novas tensões e muito cansaço para direções e corpo docente.
Perante este quadro muito real (que, como já referi, também atinge as escolas privadas), não admira o índice de revolta manifestado pelos professores e diretores das escolas públicas. E por detrás das questões relativas à precariedade, ao modelo de colocação, ao modelo de avaliação, à (não) atribuição de vencimentos compatíveis, etc., está o desgaste contínuo causado pela profissão docente, onde os maus alunos e os pais pouco colaborativos contribuem desfavoravelmente.
Urge, pois, valorizar e dignificar a função docente, respeitando os diretores e os professores (e os funcionários, claro), promovendo a sua autoridade, e confiando na instituição escolar.
Estamos perante uma das profissões mais importantes da sociedade – porque o professor ajuda a preparar as novas gerações para “a vida” – e o Estado, a sociedade e os pais não a têm sabido acarinhar e promover. O resultado está à vista de todos: mau estar nas escolas, resultados escolares abaixo do expectável e falta de gente nova que opte por uma carreira docente. O desafio premente – porque o quadro é deveras preocupante – é encontrar formas de dar a volta a esta situação, valorizando socialmente a figura do professor – devolvendo-lhe a autoridade – e criando condições para que a profissão seja, efetivamente, considerada e cativante.
Incumbe, prioritariamente, ao Estado velar pela escola (pública e privada) e pelos professores, a fim de educarem bem os alunos. Aos professores, incumbirá, naturalmente, a dignificação da sua profissão e classe. Mas também os alunos e as famílias têm de contribuir, fortemente, para que na sala de aula, nos corredores e nos recreios (e nas salas de atendimento dos encarregados de educação e nos seus grupos do WhatsApp) haja boa educação e ambiente propício para as aprendizagens.
Baixar a tensão da escola é uma tarefa de todos nós. E uma tarefa urgente.
Jorge Cotovio
Secretário-Geral da APEC no Observador